No início da década passada, já se ouviam fortes manifestações de que o sistema penitenciário brasileiro estava falido. Quando isso partia dos variados núcleos sociais, em forma de lamento, era a população revelando sentir-se desprotegida, mais ainda, em razão de a espiral da violência estar sendo alimentada, também, de dentro dos estabelecimentos penais. Quando a expressão era usada por certos políticos, era desinformação ou exagero na retórica da maioria. Técnicos de defesa social, quando instados, sempre disseram que, definitivamente, o sistema não estava falido, mas, sim abandonado, relegado, menosprezado, desassistido. E, por isso, se antes era efeito da violência, o sistema estava transformando-se em causa.
Dentre ações inovadoras adotadas pelo governo mineiro, instalado em 2003, está a criação da Secretaria de Defesa Social, resultante da fusão da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos com a Secretaria de Segurança Pública. Em sua estrutura, uma Subsecretaria chefiada e dirigida, nos vários escalões, por profissionais, com larga experiência em segurança social, para cuidar da Administração Penal. Esta, assim entendida como a parte específica da Execução Penal cometida ao Executivo, que muitos chamam, restritivamente, de Sistema Penitenciário, Sistema Prisional e, até, Sistema Carcerário. Partindo dessa premissa, a Subsecretaria estabeleceu e estreitou contatos com juízes e promotores, visando a otimização do trabalho da Execução Penal através instalação de um real e fortalecido sistema.
Em paralelo a correções urgentes e inovações pontuais, identificou expressivos aumentos e diversificação no espectro da tipificação e uma nefasta evolução da covardia e da organização no currículo de novos custodiados. Para enfrentar essa revigorada ameaça social, encontrou uma configuração anacrônica, com recursos humanos, logísticos e administrativos insuficientes, além de uma acentuada dissonância entre as rotinas e os procedimentos operacionais desejáveis e necessários. Em relação à efetividade – cuja ausência era fator de deficiência crônica – elegeu três procedimentos fundamentais para serem desenvolvidos: Profissionalização, Clara definição de responsabilidade pelos resultados e Aperfeiçoamento das atividades finalísticas de Custódia e Ressocialização.
Cerrou fileiras com os idealistas de um Sistema o menos degradante possível, em consonância com a Declaração Internacional dos Direitos Humanos, Declaração dos Direitos Humanos das Nações Unidas, Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação da Mulher e outras afins, buscando implantação de condições de vida mais dignas para os apenados. No tocante à essência da atividade-fim da administração penal – a custódia e a ressocialização – valendo-se do novíssimo conceito de Defesa Social, foram adotadas providências, pela Subsecretaria, que culminaram com a criação da Superintendência de Coordenação da Guarda Penitenciária e, também, da Diretoria de Inteligência Penitenciária, em junho de 2003. Isso se deu em razão de pesquisas, aceitação e convicção do entendimento de a Administração Penal ser realizada, embasada no Poder de Polícia Penal, em duas vertentes: a Guarda Prisional, que realiza a custódia, e um Corpo Técnico (advogados, médicos, psicólogos, enfermeiros, pedagogos, professores, dentistas, assistentes sociais, etc.) encarregado da ressocialização.
A Administração Penal é, portanto, um dos ramos de polícia, a Polícia Penal que se junta aos demais no denominado Espectro ou Ciclo de Polícia:
Polícia administrativa (regulamentação e sanção);
Polícia ostensiva (inibir vontades e obstaculizar oportunidades);
Polícia judiciária (investigação de autoria e materialidade de delitos);
Polícia de desastres (prevenção e sustinência);
Polícia penal (custódia e ressocialização).
Em maio de 2003, tendo como inspiração o Comando de
Operações Táticas – COT – da Polícia Federal, foi criado o Comando de Operações
Penitenciárias Especiais – COPE – como força de reação
preliminar da Subsecretaria, para atuar em ocorrências internas, de relativa
complexidade, antecedendo e, quase na totalidade, desonerando o emprego de forças especiais da Polícia Militar (PM). Estudos
indicaram, também, a conveniência de se treinar, de se qualificar um corpo próprio para
desobrigar a PM dos trabalhos de custódia – guarda de muralhas,
guarda perimetral, guarda de acessos, escoltas diversas, recapturas, revistas e inspeções
em geral – em todos os estabelecimentos penais, ensejando que efetivos - PM fossem realocados em patrulhamento de logradouros
públicos.
Em parceria com a Força Estadual (a PM), foi elaborado e executado um plano de treinamento para agentes penitenciários assumirem, paulatinamente, as ações de custódia, o que se iniciou com a assunção da guarda externa da Penitenciária Nelson Hungria, quando uma Companhia da Polícia Militar foi liberada e instalada no bairro Nova Contagem.
Seguiu-se o recebimento da guarda externa da Penitenciária José Maria Alckmin, permitindo lançamento de considerável número de policiais militares no policiamento ostensivo geral, na cidade de Ribeirão da Neves.
Na sequência, os Centros de Remanejamento do Sistema Prisional (CERESPs) da Gameleira, Betim, São Cristovão, Ipatinga, Juiz de Fora e, ainda, as cadeias públicas, reformadas e com a denominação de presídios municipais.
A transferência do encargo, desses locais para a Subsecretaria, permitiu que expressivo efetivo da Polícia Civil (PC) retornasse à atividade finalística de investigação. O aumento de unidades denominadas Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) foi um fato positivo. Fato que chamou atenção, à época, foi o aumento altamente positivo na aplicação de penas restritivas de direito, contrastando, porém, com o medo de membros da sociedade
Em parceria com a Força Estadual (a PM), foi elaborado e executado um plano de treinamento para agentes penitenciários assumirem, paulatinamente, as ações de custódia, o que se iniciou com a assunção da guarda externa da Penitenciária Nelson Hungria, quando uma Companhia da Polícia Militar foi liberada e instalada no bairro Nova Contagem.
Seguiu-se o recebimento da guarda externa da Penitenciária José Maria Alckmin, permitindo lançamento de considerável número de policiais militares no policiamento ostensivo geral, na cidade de Ribeirão da Neves.
Na sequência, os Centros de Remanejamento do Sistema Prisional (CERESPs) da Gameleira, Betim, São Cristovão, Ipatinga, Juiz de Fora e, ainda, as cadeias públicas, reformadas e com a denominação de presídios municipais.
A transferência do encargo, desses locais para a Subsecretaria, permitiu que expressivo efetivo da Polícia Civil (PC) retornasse à atividade finalística de investigação. O aumento de unidades denominadas Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) foi um fato positivo. Fato que chamou atenção, à época, foi o aumento altamente positivo na aplicação de penas restritivas de direito, contrastando, porém, com o medo de membros da sociedade
civil em serem
designados fiscais dessas medidas.
Estudos foram iniciados visando a atribuir-se essa atividade e outras de fiscalização ou de apoio (livramento condicional, saídas autorizadas, acompanhamento de egressos, medidas de segurança, fiscalização de penas restritivas de direito, etc.) à Guarda Penal, à semelhança e em ampliação ao que faz a agência federal dos Estados Unidos da América – U.S. Marshals que, dentre outras realiza tarefas de segurança de tribunais, de cumprimento de mandados de prisão, de escolta de presos e de recapturas.
Ao se iniciar o governo de 2003, a população prisional (presos condenados e provisórios) estava distribuída:
Na Subsecretaria, com 5.656 (cinco mil seiscentos e cinqüenta e seis) e,
Na Polícia Civil com 17.642 (dezessete mil seiscentos e quarenta e dois).
Implantado um programa de transferência gradual e sucessiva de presos, ao final de 2011 a população carcerária de 49.697 (quarenta e nove mil seiscentos e noventa e sete) se distribuía em:
41.328 (quarenta e um mil trezentos e vinte e oito) na Subsecretaria,
6.578 (seis mil quinhentos e setenta e oito) na PC e,
1.791 (hum mil setecentos e noventa e hum) nas Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (APACs), em:
129 (cento e vinte e nove) estabelecimentos penais, distribuídos em:
106 (cento e seis) dos 853 municípios mineiros.
Ressalte-se que nos cargos de diretores (geral, de operações, de inteligência, administrativo) em sua quase totalidade, estão comissionados agentes penais detentores de curso superior, conforme Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com o Ministério Público mineiro, permitindo reunir conhecimento e experiência na gestão penal.
Pesquisada, entendida e dimensionada a vulnerabilidade social que pode advir de fraco desempenho de uma Administração Penal – com reflexos altamente negativos na segurança objetiva e na subjetiva – foi elaborado o Plano de Ação, bienal (2005-2006), para preencher demandas do próprio Sistema de Administração Penal e dos demais sistemas com os quais tem ligação: o Sistema de Defesa Social (salvaguarda e inteiração social), o Sistema de Contenção Criminal (prevenção e repressão), o Sistema de Persecução Penal (polícia, defensoria pública, ministério público, judiciário), Sistema de Execução Penal (judiciário e executivo).
Em seu núcleo, os vários pressupostos e premissas que lhe deram causa, os objetivos gerais e específicos fixados para serem atingidos, as quatro grandes áreas a serem desenvolvidas (dignidade do preso, motivação interna, profissionalização e modernização administrativa) e as respectivas metas a serem alcançadas.
Quanto à definição, fixação e priorização na vertente da Ressocialização, a Subsecretaria considerou e difundiu que cabe ao Sistema de Administração Penal tornar o cumprimento da pena mais suportável, facilitando a remição do regime, o contato com a família, o desenvolvimento cultural, a alfabetização, o aperfeiçoamento profissional, o aprendizado de profissões, a prática do credo preferido, a manutenção de condições de vida saudáveis e a recreação. Divulgou, visando ao êxito da missão, ser fundamental o entendimento de que, depois de preso, o indivíduo passa à condição de “Custodiado pelo Estado”, sendo este o único responsável pela integridade física, moral e psicológica daquele.
A Subsecretaria não hesitou, não se corou em buscar experiências exitosas em órgãos similares no Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília, dando origem a um efetivo Sistema de Administração Penal, consoante fixação de uma doutrina de Polícia Penal que, paulatinamente, se consolida e se expande, servindo de referência para outros Estados. Certamente isso ocorre em virtude de Subsecretários subsequentes terem dado continuidade ao projeto inicial, incorporando, evidentemente, criativos, lúcidos e oportunos adendos. Enfim, a atenção que vem sendo dada ao sistema de administração penal dos vários Estados e da União demonstra que as intervenções técnico-profissionais têm sido extremamente adequadas.
Realmente, a efetividade na administração penal, em nosso país, começa a ser consolidada através de uma gestão profissional que implementa e incrementa, no mínimo, a profissionalização da atividade, o profissionalismo de seus executores e a modernização tecnológica na administração e na logística.
É possível que a Guarda Penal mineira – originariamente Guarda Penitenciária – tenha desalojado a inércia que, até então, vigorava.
No Congresso, desde 2004, está a PEC-308, que busca o reconhecimento normativo da Polícia Penal. Alguns parlamentares estaduais, diante dessa demora, estão inclinados a apresentar PEC estadual, reconhecendo que Administração Penal é realizada com fundamento no poder de polícia penal e, por via de conseqüência, a Administração Penal é a própria Polícia Penal.
Esse reconhecimento, fundamentalmente, preencherá uma gritante necessidade social, um vácuo dentro do sistema de defesa social. Residualmente, fortalecerá a autoridade desse servidor público especial no exercício dessa atividade perigosa e estressante.
Estudos foram iniciados visando a atribuir-se essa atividade e outras de fiscalização ou de apoio (livramento condicional, saídas autorizadas, acompanhamento de egressos, medidas de segurança, fiscalização de penas restritivas de direito, etc.) à Guarda Penal, à semelhança e em ampliação ao que faz a agência federal dos Estados Unidos da América – U.S. Marshals que, dentre outras realiza tarefas de segurança de tribunais, de cumprimento de mandados de prisão, de escolta de presos e de recapturas.
Ao se iniciar o governo de 2003, a população prisional (presos condenados e provisórios) estava distribuída:
Na Subsecretaria, com 5.656 (cinco mil seiscentos e cinqüenta e seis) e,
Na Polícia Civil com 17.642 (dezessete mil seiscentos e quarenta e dois).
Implantado um programa de transferência gradual e sucessiva de presos, ao final de 2011 a população carcerária de 49.697 (quarenta e nove mil seiscentos e noventa e sete) se distribuía em:
41.328 (quarenta e um mil trezentos e vinte e oito) na Subsecretaria,
6.578 (seis mil quinhentos e setenta e oito) na PC e,
1.791 (hum mil setecentos e noventa e hum) nas Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (APACs), em:
129 (cento e vinte e nove) estabelecimentos penais, distribuídos em:
106 (cento e seis) dos 853 municípios mineiros.
Ressalte-se que nos cargos de diretores (geral, de operações, de inteligência, administrativo) em sua quase totalidade, estão comissionados agentes penais detentores de curso superior, conforme Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com o Ministério Público mineiro, permitindo reunir conhecimento e experiência na gestão penal.
Pesquisada, entendida e dimensionada a vulnerabilidade social que pode advir de fraco desempenho de uma Administração Penal – com reflexos altamente negativos na segurança objetiva e na subjetiva – foi elaborado o Plano de Ação, bienal (2005-2006), para preencher demandas do próprio Sistema de Administração Penal e dos demais sistemas com os quais tem ligação: o Sistema de Defesa Social (salvaguarda e inteiração social), o Sistema de Contenção Criminal (prevenção e repressão), o Sistema de Persecução Penal (polícia, defensoria pública, ministério público, judiciário), Sistema de Execução Penal (judiciário e executivo).
Em seu núcleo, os vários pressupostos e premissas que lhe deram causa, os objetivos gerais e específicos fixados para serem atingidos, as quatro grandes áreas a serem desenvolvidas (dignidade do preso, motivação interna, profissionalização e modernização administrativa) e as respectivas metas a serem alcançadas.
Quanto à definição, fixação e priorização na vertente da Ressocialização, a Subsecretaria considerou e difundiu que cabe ao Sistema de Administração Penal tornar o cumprimento da pena mais suportável, facilitando a remição do regime, o contato com a família, o desenvolvimento cultural, a alfabetização, o aperfeiçoamento profissional, o aprendizado de profissões, a prática do credo preferido, a manutenção de condições de vida saudáveis e a recreação. Divulgou, visando ao êxito da missão, ser fundamental o entendimento de que, depois de preso, o indivíduo passa à condição de “Custodiado pelo Estado”, sendo este o único responsável pela integridade física, moral e psicológica daquele.
A Subsecretaria não hesitou, não se corou em buscar experiências exitosas em órgãos similares no Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília, dando origem a um efetivo Sistema de Administração Penal, consoante fixação de uma doutrina de Polícia Penal que, paulatinamente, se consolida e se expande, servindo de referência para outros Estados. Certamente isso ocorre em virtude de Subsecretários subsequentes terem dado continuidade ao projeto inicial, incorporando, evidentemente, criativos, lúcidos e oportunos adendos. Enfim, a atenção que vem sendo dada ao sistema de administração penal dos vários Estados e da União demonstra que as intervenções técnico-profissionais têm sido extremamente adequadas.
Realmente, a efetividade na administração penal, em nosso país, começa a ser consolidada através de uma gestão profissional que implementa e incrementa, no mínimo, a profissionalização da atividade, o profissionalismo de seus executores e a modernização tecnológica na administração e na logística.
É possível que a Guarda Penal mineira – originariamente Guarda Penitenciária – tenha desalojado a inércia que, até então, vigorava.
No Congresso, desde 2004, está a PEC-308, que busca o reconhecimento normativo da Polícia Penal. Alguns parlamentares estaduais, diante dessa demora, estão inclinados a apresentar PEC estadual, reconhecendo que Administração Penal é realizada com fundamento no poder de polícia penal e, por via de conseqüência, a Administração Penal é a própria Polícia Penal.
Esse reconhecimento, fundamentalmente, preencherá uma gritante necessidade social, um vácuo dentro do sistema de defesa social. Residualmente, fortalecerá a autoridade desse servidor público especial no exercício dessa atividade perigosa e estressante.
(*) Ex-Diretor Geral da Polícia Federal;
(**)Ex-Subsecretário de Administração Penal de MG.
(***) Ex-Comandante da Região Metropolitana de BH-MG;
(****)Ex-Superintendente de Coordenação da Guarda Penal de MG.
Autor: Amauri Meireles
Coronel da Reserva da Polícia Militar de Minas Gerais,
Ex-Comandante da Região Metropolitana de BH - PMMG, Ex-Superintendente da
Guarda Prisional de MG.
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